domingo, 22 de setembro de 2013

Coação Irresistível e Obediência Hierárquica

UNIVERSIDADE LUTERANA DO BRASIL – ULBRA
GRADUAÇÃO EM DIREITO





Acadêmicos:      Bruno Augusto Psendziuk Rodriguez
Patrícia Regina Branco de Moura
Rodrigo Wohlbrecht Ribeiro
Professor:          Rafael Lopes Ariza
Disciplina:           Direito Penal II




Coação Irresistível
Obediência Hierárquica





1.  Coação Irresistível

1.1. Definição
O fato típico gerado por uma coação irresistível são excluídos de culpabilidade, pois não é esperado nenhum tipo de conduta diversa por parte do coato, logo assim configurado, a responsabilidade do ato é transferida para o coator.
Código Penal Brasileiro:
Art. 22. A Se o fato é cometido sob coação irresistível ou em estrita obediência da ordem, não manifestamente ilegal, de superior hierárquico, só é punível o autor da coação ou da ordem. (-Grifei)

1.2. Coação Física
O Coação física é o emprego de força física para que alguém faça ou deixe de fazer alguma coisa.
Quando o sujeito pratica o fato sob coação física irresistível, significa que não está agindo com liberdade. Não há a vontade integrante da conduta, que é o primeiro elemento do fato típico. Então não há crime por ausência de conduta.
Exemplo:
O sujeito mediante força bruta, impede que o guarda ferroviário combine os binários e impeça uma colisão de trens.

A coação que exclui a culpabilidade é a moral. Tratando-se de coação física, o problema não é de culpabilidade, mas sim de fato típico, que não existe em relação ao coato por ausência de conduta voluntária.

1.3. Coação Moral
O Coação moral é o emprego de grave ameaça para que alguém faça ou deixe de fazer alguma coisa.
Quando o sujeito comete o fato típico e antijurídico sob coação moral irresistível não há culpabilidade em face da inexigibilidade de conduta diversa. A culpabilidade desloca-se da figura do coato para a do coator.
Exemplo:
O sujeito constrange a vítima sob ameaça de morte, a assinar um documento falso.

O Constrangimento é Moral, não é físico.
Atua diretamente na mente, na vontade do sujeito.


O DIREITO NÃO EXIGIRÁ DAS PESSOAS ATITUDES ANORMAIS OU HEROICAS.

1.4. Coação Resistível
A coação moral deve ser irresistível. Tratando-se de coação moral resistível não há exclusão da culpabilidade, incidindo uma circunstância atenuante.
Código Penal Brasileiro:
Art. 65. São circunstâncias que atenuam a pena:
III – ter o agente:
c) cometido o crime sob coação a que podia resistir, ou em cumprimento de ordem de autoridade superior, ou sob a influência de violenta emoção, provocada por ato injusto da vítima;

1.5. Elementos da Coação Irresistível
São necessários os seguintes elementos para se configurar uma Coação Moral Irresistível:
·         Existência de um coator – responderá pelo crime;
·         Irresistível – não tem como resistir;
·         Proporcionalidade – proporção entre os bens jurídicos.

O Coação moral ainda subdivide-se em dois tipos, que se distingue no alvo a ser coagido:

a)      Coação Própria
Ameaça a própria pessoa que está praticando o crime.

b)      Coação de Terceiros
O Coação moral em que a ameaça atinge outras pessoas.
Exemplo:
O caso da coação contra o gerente do banco que se não for até o banco e trouxer  o dinheiro, matarão sua família.

1.6. Coação Moral Irresistível Putativa
Existe uma ameaça inevitável, insuperável, acompanhada de um perigo sério, que vicia a vontade do coacto de tal forma, a impedi-lo de cumprir o dever jurídico, não sendo razoável a este expor-se a qualquer que seja o dano. Sua forma putativa ocorre quando o agente imagina encontrar-se sob coação moral irresistível por erro. Neste caso, haverá exclusão da culpabilidade.
Exemplo:
Um trabalhador recebe um bilhete que consta uma ameaça exterminar seu filho, que supostamente fora sequestrado, obrigando-o a colaborar num roubo contra a empresa; posteriormente descobre que o bilhete era endereçado a um colega.


2.  Jurisprudência na Coação Irresistível

2.1. Excludente da Coação Moral no Tráfico de Drogas
Está cada vez mais comum e corriqueiro nas pesquisas jurisprudenciais a tentativa de associação desta excludente de ilicitude vinculada ao crime de Tráfico de Drogas, sob forte alegação de o réu ter se associado ao tráfico para, sob ameaça de traficantes, pagar suas dívidas. Este argumento não vem sido aceito, pois o tráfico não é a única solução para o pagamento de dívidas com traficantes.
23 das 40 primeiras ementas pesquisadas no site do TJ-RS, com o conteúdo “coação moral irresistível”, no dia 08 de junho de 2012, tratam da relação entre a excludente da Coação Moral e o Tráfico de Drogas.

2.2. Produção de Provas da Coação Moral
O Tribunal também pauta os mecanismos de produção de provas para que se dê causa a esta excludente de ilicitude, dentre as primeiras 40 ementas pesquisadas (4 primeiras páginas do site do TJ-RS), foram apenas 02 casos de deferimento por Coação Moral Irresistível, logo podemos constatar que é comum a tentativa, porém entre “pedir e levar” existe uma grande diferença.

2.3. Termos da Pesquisa
“coação moral irresistível”
Data: 08/11/2012
Site: http://www.tjrs.jus.br/busca/
Acórdãos Pesquisados Especificamente: 70043427293, 70036281947, 70044128247 e 70035835479.

APELAÇÃO CRIMINAL. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. EXERCÍCIO DA FUNÇÃO DE VIGILANTE NO MOMENTO DOS FATOS. COAÇÃO MORAL IRRESISTÍVEL.
O acusado, vigilante de empresa privada, ao cumprir determinação de trabalho, portando arma de fogo de propriedade da empresa, sem porte, não pratica o crime do art. 14, caput, da Lei de Armas, por ser hipótese de inexigibilidade de conduta diversa, decorrente de coação moral irresistível, pois caso não realizasse a conduta tipificada, não possuindo estabilidade empregatícia, correria sério risco de perda do seu emprego e, consequentemente,  do seu sustento.
RECURSO DEFENSIVO PROVIDO.
Apelação Cível nº 70044128247, Terceira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Francisco Conti, julgado em 06/10/2011.


3.  Obediência Hierárquica

3.1. Definição
A ordem de superior hierárquico é a manifestação de vontade de um titular de função a um funcionário que lhe é subordinado, no sentido de que realize uma determinada conduta, omissiva ou comissiva.

Código Penal Brasileiro:
Art. 22. A Se o fato é cometido sob coação irresistível ou em estrita obediência da ordem, não manifestamente ilegal, de superior hierárquico, só é punível o autor da coação ou da ordem. (-Grifei)

3.2. Ordem Legal
Em caso de ordem legal, não existe a excludente de culpa em tela, pois poderá caracterizar causa de excludente de ilicitude, como o “exercício de estrito cumprimento de dever legal”.
Exemplo:
O policial que cumpre a ordem superior de busca e apreensão, evidentemente municiado de Mandado que o autoriza.


3.3. Ordem Ilegal – Não Manifestada
Quando a ordem for ilegal, mas não manifestamente, o subordinado que a cumpre não agirá com culpabilidade, por ter avaliado incorretamente a ordem recebida, incorrendo numa espécie de erro de proibição.

A obediência à ordem não manifestamente ilegal de superior hierárquico, torna viciada a vontade do subordinado e afasta a exigência de conduta diversa por parte do comandado.

Nestes casos será punido tão somente o autor da ordem.

São elementos essenciais para que se configure esta excludente de culpabilidade:
·         Obediência às formalidades legais;
·         Não manifestamente ilegal – conduz o subordinado executor ao erro;
·         Obediência estrita.

3.4. Ordem Manifestadamente Ilegal
Se a ordem cumprida for manifestamente ilegal é punível também o subordinado juntamente com o seu superior.
Não compete ao comandado julgar a oportunidade, a conveniência ou a justiça da prática do fato constitutivo da ordem, mas somente a sua legalidade.
Exemplo:
O “Pau-de-Arara”, utilizado como mecanismo de tortura na Ditadura Militar Brasileira.

“Atualmente, não se admite mais o cego cumprimento da ordem ilegal, permitindo-se que o inferior examine o conteúdo da determinação, pois ninguém possui dever de praticar uma ilegalidade” (Jesus, 1992, p. 436)

3.5. Regulamento Militar x Ilegalidade
É bastante complexo o julgamento de ponderação legal recebida por um soldado, devido ao seu treinamento e juramentos prestado à obediência estrita. Temos configurado um conflito entre Excesso de Poder x Princípio de Legalidade, onde muitas vezes o comandado é coagido a tomar atitudes precipitadas na forma de defender bens jurídicos erroneamente avaliados.
O Regulamento Disciplinar do Exército, publicado em 26 de agosto de 2002, por meio do Decreto N° 4.346, corrobora para esta tese:



X
Art. 8o  A disciplina militar é a rigorosa observância e o acatamento integral das leis, regulamentos, normas e disposições, traduzindo-se pelo perfeito cumprimento do dever por parte de todos e de cada um dos componentes do organismo militar.
§ 1o São manifestações essenciais de disciplina:
[...]
II - a obediência pronta às ordens dos superiores hierárquicos;
[...]

Art. 9o  As ordens devem ser prontamente cumpridas.
[...]
§ 2o  Cabe ao subordinado, ao receber uma ordem, solicitar os esclarecimentos necessários ao seu total entendimento e compreensão.
§ 3o  Quando a ordem contrariar preceito regulamentar ou legal, o executante poderá solicitar a sua confirmação por escrito, cumprindo à autoridade que a emitiu atender à solicitação.
[...]



Há um visível choque de Princípios, que em tese é facilmente resolvido, mas que na prática pode configurar sérios problemas para quem defronta tais situações.

4.  Jurisprudência

APELAÇÃO. DEFESA. ART. 163 DO CPM. RECUSA DE OBEDIÊNCIA. APELO IMPROVIDO.
1. Militar que se recusa a obedecer ordem de transportar paciente para realização de exames proferida por superior hierárquico comete o crime de recusa de obediência, sendo que a posterior alegação de falta de capacitação profissional, quando o verdadeiro motivo consistia em não estar na escala de sobreaviso, não ilide a tipicidade da conduta.
2. Ainda que a recusa à ordem do superior fosse por julgá-la ilegal, o dever de obediência hierárquica atinente aos militares não lhe eximiria do cumprimento de tal determinação, já que era do conhecimento de outros militares ali presentes a ordem recebida e, portanto, ao superior caberia eventual responsabilização pelo referido transporte.
3. A obediência hierárquica no âmbito militar possui peculiaridades, como se verifica na lição de Jorge Alberto Romeiro "o militar só pode e deve desobedecer a ordem direta do superior hierárquico, em matéria de serviço, sem incorrer no crime de insubordinação, se ela tem por objeto a prática de ato manifestamente criminoso." (Curso de direito penal militar: parte geral. São Paulo: Saraiva, 1994. p. 124). O transporte de um paciente para efetuar um exame não pode ser considerado um ato manifestamente criminoso. (-Grifei)
APELO IMPROVIDO. DECISÃO UNIFORME.
Apelação nº 0000011-09.2006.7.04.0004, Superior Tribunal Militar, Relator: José Américo dos Santos, julgado em 27/05/2010.

4.1. Uma Breve Entrevista
Ao expor o problema a um colega de trabalho (motorista de ambulância da Prefeitura Municipal de Dois Irmãos – RS), perguntei se existe algum tipo de capacitação especial para que um servidor público possa conduzir alguém para realizar exames, eis a resposta:

“É necessário Carteira de Habilitação, Cursos certificados pelo Detran para transporte de Passageiros Ambulatoriais e Curso de Transporte Seguro e de Qualidade para Condutores de Emergência.”
- Jorge Valério, motorista, Servidor Público Municipal

4.2. Tendência de Inocorrência
O Superior Tribunal Militar, por meio de Súmulas e Acórdãos, tem séria tendência a não configurar, desqualificando ao máximo, as alegações de “Obediência Hierárquica”, muitas vezes incorrendo aos réus o crime de “Recusa da Obediência”.
Configura-se pelo Tribunal Militar um forte protecionismo aos abusos hierárquicos, com tendência à condenação dos réus, visando o mantimento de uma ordem administrativa imposta.

4.3. Termos da Pesquisa
“obediência hierárquica”
Data: 09/11/2012
Site: http://www.stm.jus.br/jurisprudencia

Acórdãos Pesquisados Especificamente: 0000011-09.2006.7.04.0004 e 0000011-42.2007.7.05.0005.

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